quinta-feira, 28 de janeiro de 2021

O estilo do grilo

Ilustração de Nina Tenser

Era uma vez um grilo
que morava numa gaiola
em grande estilo.
De cri-cri em cri-cri
Foi vivendo tranquilo
A comer alface ao quilo,
Quase tão voraz
Como qualquer esquilo.
Respondendo ao protesto
Sobre o ruído que fazia,
Disse com ironia
“Se era silêncio que queria
Era só pedi-lo,
Que um grilo não é
Uma telefonia”

Luiz Infante


“O passado não é o antecedente do presente, é a sua fonte”.
Ecléa Bosi
“O passado não é o antecedente do presente, é a sua fonte”.
Ecléa Bosi


Confira abaixo alguns Filósofos que você vai conhecer:

domingo, 20 de setembro de 2020

Poema Panfletário

Eduardo R. Calzado

Duras serão as pedras no chão que pisaremos.
Por serem duras é que abandonei
Os caminhos movediços
Deste mundo em agonia...

Suaves serão as palavras que falaremos.
Por serem suaves é que abandonei
Os caminhos movediços
Deste mundo em agonia...

Pedras e palavras: certas, necessárias
Duras, suaves e seguras.
E uma casa nova.
E caminhos novos de alegria...

António Dias Cardoso (1933-2006)


quinta-feira, 10 de setembro de 2020

Silêncio

Richard Edward Miller

Uma noite,
quando o mundo já era muito triste,
veio um pássaro da chuva e entrou no
teu peito,
e aí, como um queixume,
ouviu-se essa voz de dor que já era a tua
voz,
como um metal fino,
uma lâmina no coração dos pássaros.

Agora,
nem o vento move as cortinas desta casa.
O silêncio é como uma pedra imensa,
encostada à garganta.

José Agostinho Baptista

sexta-feira, 28 de agosto de 2020

Bucólica

Lorenzato - Casinha da vovó

A vida é feita de nadas:
De grandes serras paradas
À espera de movimento;
De searas onduladas
Pelo vento;

De casas de moradia
Caiadas e com sinais
De ninhos que outrora havia
Nos beirais;

De poeira;
De sombra de uma figueira;
De ver esta maravilha:
Meu Pai a erguer uma videira
Como uma mãe que faz a trança à filha.

Miguel Torga (1907-1995)

Logos

Rafael de Sanzio - Escola de Atenas
Ao sr. D. Nicolás Salmerón

Tu, que eu não vejo, e estás ao pé de mim
E, o que é mais, dentro em mim ‑ que me rodeias
Com um nimbo de afetos e de ideias,
Que são o meu princípio, meio e fim...

Que estranho ser és tu (se és ser) que assim
Me arrebatas contigo e me passeias
Em regiões inominadas, cheias
De encanto e de pavor... de não e sim...

És um reflexo apenas da minha alma,
E em vez de te encarar com fronte calma
Sobressalto-me ao ver-te, e tremo e exoro-te...

Falo-te, calas... calo, e vens atento...
És um pai, um irmão, e é um tormento
Ter-te a meu lado... és um tirano, e adoro-te!

Antero de Quental (1842-1891)
Logos
(Do grego lógos, «razão; palavra»)

Nome masculino de 2 números (Substantivos que apresentam uma só forma para o singular e para o plural.)

1. A faculdade de raciocinar e de falar, que distingue o ser humano dos outros animais e lhe permite apreender cognitivamente a realidade; razão.
2.
Filosofia: na doutrina de Heraclito, princípio cósmico de que derivam a ordem e a racionalidade do universo.
3.
Filosofia: na doutrina estoica, o princípio que anima a matéria e determina o destino humano.
4.
Filosofia: na doutrina neoplatónica, agente mediador entre a realidade sensível e o inteligível.
5.
Religião [comm R Maiúscula]: no Evangelho de João, a palavra divina, princípio criador identificado com a segunda pessoa da Santíssima Trindade, encarnada em Jesus Cristo.

segunda-feira, 19 de agosto de 2019

Todas as fotografias são eu

Cyril Rolando

Perecíveis, sentimentais, eu próprio perecível
Tudo o que nos arriscamos a perder. dar-te isso. vais per-
dê-lo.
Continuarei a não me parecer com o mundo.
Eu também já fui mundo.
Tão semelhante que podia ser confundido com ele.

Não dissipo a sombra do esquecimento. tento brilhar ful-
gurante fora da memória. contrabando indiscernível da
pura recordação.

Entra, assiste à minha infância interior, ao segundo lado do tempo.

Jacques Roubaud
Tradução: José Mário Silva

sexta-feira, 29 de setembro de 2017

A glória não está nas alturas

Vincent van Gogh

A glória não está nas alturas.
Está no chão, está na luta áspera
da planície, da rua.
Está onde a matéria sofre
e se ensanguenta.
Está, não nas coisas que sobem,
mas nas coisas que caem.

A glória não está no céu lúcido,
que carrego nos ombros, desde
que nasci. Sou pequeno demais,
pra carregar estrelas
tão numerosas quanto indecifráveis.
O que posso fazer é dar um nome, a cada uma delas,
e inventar constelações.

Estou farto de azul e de outros mitos
que encontrei no mundo. A aurora
que se diz vir do além,
não me satisfaz, não é a aurora que eu sonho.
Doura-me as mãos, apenas por ser loura.
Não resolve, sequer, o meu terrível monólogo.
Antes, repete o erro imemorial.

Cassiano Ricardo (1885-1974)